quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

O Velho na Varanda

O velho, da casa velha da esquina, havia enlouquecido. Não resistiu ao último outono, quando sua mulher se apaixonou repentinamente por um “cara mais novo”, assim como ela mesma admitira para uma amiga. “O amor havia acabado” disse ela. Sim o amor acaba. Até flores de plástico morrem (ao contrário do que diz aquela canção) e a gente cansa de tanto ver elas na mesa da sala!

Ele então sentiu o baque da queda quando ela chegou e o encostou contra a parede da verdade (dela obviamente) nua, crua e dolorosa. Ele com o olhar tristonho disse: “vou sentir falta de te ver com aquele vestido florido cozinhando nas manhãs de domingo enquanto eu tomava um chimarrão. O teu cheiro de alfazema nas manhãs de segunda quando te dava o primeiro beijo do dia”.

Não implorou para ela ficar. Sentiu que ali era o fim das coisas que tanto haviam compartilhado, mas o começo de tantas outras. Desejou sorte a sua, já não mais, companheira. Deu-lhe um beijo na testa e disse adeus.

“Reaprender a viver sozinho” era a frase mais repetida no espelho do banheiro todo o dia antes de se barbear. Deu-se ao luxo de comprar alguns vinhos raros e aprendeu a tocar violão para espantar a tristeza que vinha morena e irresistível, com olhos grandes e claros, pedindo colo nas noites em que ele sentava na varanda e cruzava os braços lembrando o passado.

Dizem que passou cinco meses bem, não resistiu mais que isso e caiu como a última folha que cai da árvore antes de começar a estação mais fria do ano Agora ele anda pela casa com um cobertor nas costas, um pé de chinelo, uma caneta na mão e um caderno onde ele anota cada frase que mais tarde na varanda vira canção.